quarta-feira, 30 de abril de 2014

O desespero de um pai e uma mãe - e o amor pela filha...

Era meados de janeiro, em 2012. Ainda lembro o dia exato em que minha filha se queixou de dor. Constatei que ela estava muito quente. Parecia febre. Logo vieram os vômitos, as dores no corpo e a falta de ar. 

Preocupado à levei ao posto de saúde. Lá fizeram exame de sangue e mesmo sem o resultado, começaram  tratando como suspeita de dengue. Fiquei um pouco mais calmo, mesmo se tratando de uma doença tão grave como a dengue, minha filha 'tinha um diagnóstico' e logo voltaria para casa. A dengue quando tratada nos primeiros sintomas possibilita isso. Porém, passaram-se 21 dias de tratamento e os sintomas continuavam os mesmos. À esta altura eu e a minha esposa passávamos de hospitais em hospitais, postos de saúde e clínicas particulares, à procura de ajuda. Ninguém já não sabia ao certo o que nossa filhinha tinha. 

Então em um dia após essas idas e vindas ao hospital, minha esposa foi comprar uma medicação na farmácia e conversando com o farmacêutico, ela comentou o que estava acontecendo com nossa filha. Que já não sabia o que fazer nem qual hospital levá-la para avaliação. Já conhecia de cor aquelas avenidas que levava à todos os hospitais por ali. 

Então o farmacêutico de prontidão pediu para dar uma olhada nos exames. Com uma esperança brotando no peito minha esposa o entregou os exames e assim que ele bateu os olhos no raio x, disse que ela estava com Derrame Pleural. Para quem não sabe bem o que é isso, é quando o pulmão enche de água. É grave e precisa de tratamento. Ele a devolveu os exames e pediu que  levássemos a nossa filhinha para um hospital o mais rápido possível.

Hospital geral de Saracuruna, Caxias Rio de Janeiro, minha filha foi internada e passou a noite lá. Pela manhã o médico falou que ali não tinha condições de tratá-la. Ela teria que fazer uma punsão (que é a retirada do líquido do pulmão com uma seringa) e o risco de infecção era grande.. Não tinham estrutura para isso. Angustiados, vimos nossa filha ter alta. 

Liguei para minha mãe e contei a ela o que estava acontecendo. Ela trabalhava com um médico e quem sabe ele pudesse nos ajudar. Então ela conversou com ele e contou sobre nosso desespero, e ele pediu que levássemos nossa filha para o hospital em que ele trabalhava para que pudesse atendê-la. 

Hospital Gétulio Vargas, chegando  lá ela foi internada e finalmente foi feito a punsão. Resolvido o problema voltamos para casa esperançosos. Logo estaria tudo bem. Mas de madrugada ela começou a passar mal novamente. Meu Deus nunca me esqueço daquela noite. Tivemos que esperar até de manhã para voltarmos ao hospital e chegando lá, o médico fez um novo raio x. Viu que o pulmão dela tinha enchido novamente de água (o que não deveria acontecer) e foi feito uma nova punsão. Colhido a água levaram para exame para saber a causa do derrame pleural. Disseram que voltássemos para casa e retornássemos novamente no dia seguinte. 

No dia seguinte logo de manhã quando fomos atendidos, o médico resolveu consultar amigos também médicos para outras opiniões. O exame da água colhida na punsão não mostrava nada. Absolutamente nada. E assim passou o dia inteiro. Mais um dia e minha filha sofrendo.

No dia seguinte à encaminharam para o hospital Gaffrée Guinle, e com o encaminhamento e o nome de médicos à procurar em mãos, começou verdadeiramente a tortura. Chegamos no hospital bem cedo e minha filha já não andava mais. Fiquei perdido procurando os médicos indicados para ajudar, e ninguém sabia informar quem seriam esses médicos. Minha esposa entrou em uma sala para se informar e um médico residente falou pra ela que ali não era emergência, era um hospital Universitário e ninguém iria atende-la, que fosse procurar uma emergência. 

Então pensei, não podemos voltar pra casa. No corredor encontrei uma pessoa passando e ela falou que um dos médicos que procurava estava no 3º andar... mas como subir até lá? Minha filha já não andava sozinha. Coloquei-a em uma cadeira de rodas e fui. Consegui subir até o 3º andar e lá encontrei um dos médicos que procurava, era uma doutora. Ela olhou o encaminhamento e falou que não sabia de nada. 
Então eu vi a morte chegando pela primeira vez. Não tinha mais o que fazer, ela já não andava, respirava muito pouco, tinha muita febre e dor. Minha filha ia morrer. 

Vi saindo de uma sala um rapaz e do nada veio em minha direção, e me perguntou o que estava acontecendo. Expliquei tudo a ele e logo veio chegando uma outra doutora e ela disse que podia me ajudar. Então falei com ela e expliquei tudo desde o começo. Ela falou que só tinha um problema, teria que ter um prontuário para que fôssemos atendidos naquele hospital. Mais uma vez vi tudo acabar. Mas Deus estava com a gente, e como que por um milagre, esse desespero de agora só durou alguns minutos. Quando eu saia pelo corredor indo embora, a doutora  falou que poderia me ajudar adiantando uma consulta. Concordei, afinal era melhor que nada, mas àquela altura o que seria uma consulta a mais, minha filha já estava morrendo e não ia dar tempo.

Ela mandou que descêssemos para seu consultório que lá nos atenderia. Chegando lá, ela já estava na sala, peguei a bolsa de exames e a entreguei. Ela começou a olhar os exames e começou se interessar pelo caso - era professora em cirurgia torácica e eu leigo, não sabia com quem falava - depois de olhar todos os exames ela saiu. Depois de alguns minutos voltou e me disse que era para voltar no dia seguinte e ir direto aonde a encontrei, no 3º andar. Que não era pra ficar preocupado que iria deixar avisado para o médico que ia atender minha filha. 

Mas a minha preocupação não era essa, era se minha filha iria aguentar mais uma noite de tortura e sofrimento. Mas graças a Deus ela aguentou. E no dia seguinte voltando lá, fui até o andar que a doutora havia mandado e depois de um tempo de espera e angústia, o médico  - um anjo por sinal - chegou e fez a internação dela. Em seguida fez a punsão e retirou 1.6 lts de água do pulmão. Falou que dali a duas horas a gente podia ir embora e nessa de duas horas, passou-se a noite e no outro dia o pulmão da minha filha tava cheio de novo. 

Começaram a fazer exames e não entendiam porque o pulmão dela enchia tão rápido. Foram feitos mais três punsões e os exames não davam nada. Colocaram ela no isolamento com suspeita de Turberculose , a doutora que a atendeu no começo (a professora) resolveu fazer uma cirurgia para drenar o pulmão porque estava muito cheio. Feito a cirurgia retirou-se novamente mais 2,6 lts de água, e ela falou que em 25 anos de profissão fazendo cirurgias, nunca tinha visto aquilo. Tantas punsões e tanta água em tão pouco tempo. 
Ela viu linfomas no pulmão e deu 90% de chance de ser câncer, mas iria fazer biopsia para ter certeza . 
Agora tinha ferrado tudo de novo. O que fazer senão, esperar. Apenas. 

Nesse meio tempo ela foi transferida para a enfermaria da clínica médica . Começou mais uma guerra. Febre, vômitos e a dor, continuavam. Os mesmos sintomas e já tinham feito muitos exames e nada. Então o peito dela começou a inchar, o batimento cardíaco variava de 90 á 145, foi uma loucura sem saber o que estava acontecendo. Durante esse tempo ainda tinha que aguentar a má vontade de alguns enfermeiros(as) e médicos. E sem informação do que estava acontecendo e desesperado, cai na bobeira de conversar com a assistente social para pedir ajuda. Me arrependo até hoje, conversei com o inimigo. Ela procurou um dos médicos para falar que estávamos reclamando do atendimento dos médicos e dos enfermeiros(as). Nada a ver, eu só queria informações sobre a saúde da minha filha. Eu estava agora em um campo minado. Começou o tratamento com medicamentos fora de horário e errado varias vezes. Minha esposa teve que anotar o horário e os medicamentos para conseguir fazer o tratamento correto. 

Até agora ninguém sabia o que ela tinha, só tratavam os sintomas, tudo eram suspeitas apenas. E a cada dia ela piorava mais. Foi pro CTI (Centro de Tratamento e Terapia Intensiva) e passou uma semana lá, fizeram pesquisas e mais pesquisas e nada. Passaram-se dois meses e numa noite em especial ela havia inchado tanto que ficou deformada, teve parada cardíaca e respirava com muita dificuldade - estava morrendo - nesta noite uma enfermeira apareceu e passou a noite toda cuidando dela. Mais tarde eu saberia que essa enfermeira era na verdade Jesus Cristo. Pois minha esposa a procurou depois para agradecer e ninguém a conhecia por lá e nunca mais foi vista naquele hospital.  

Eu já estava cansado dessa luta, minha esposa esgotada também no limite, então pensei: Senhor, que seja feita então a sua vontade, eu realmente não aguento mais. Está entregue em suas mãos e eu vou aceitar a sua decisão. O seu poder seja glorificado. 
Então as coisas começaram a se resolver. Dez dias no CTI e ela saiu, voltou para a enfermaria. Mas em função de um derrame pericárdico e o coração grande, teria que fazer uma cirurgia. E no dia da cirurgia um médico pediu para que repetissem um exame mesmo com outros médicos contestando e o resultado do exame, deu que o coração dela estava normal. Sendo que ela já tinha sido internada com esse problema. Os médicos não entediam nada e para piorar, a doença que estava desencadeando tudo isso, ainda não tinha sido descoberta. 

Então, fizeram uma reunião para decidir o que iriam fazer com ela e o médico responsável chamou minha esposa e disse que já tinham feito tudo o que podiam, só restava agora a pulsoterapia (que é a administração de altas doses de medicamentos em um curto espaço de tempo), mas para isso ela teria que assinar um termo de responsabilidade porque minha filha poderia morrer durante o tratamento. Mas se ela não tomasse a medicação, morreria da doença do mesmo jeito. Assim foi feito a pulsoterapia. A residente que aplicou a medicação chorava, porque a chance de minha filha sobreviver àquilo era minima. E ninguém acreditava de fato que ela iria aguentar, por que já estava muito debilitada. 

Então como um pesadelo que finalmente chega ao fim, no dia seguinte à pulsoterapia o médico perguntou a minha filha se ela estava bem. E ela respondeu normalmente: 
- Tudo bem. Não estou sentindo nada, Dr.
Ele confirmou: Nada? 
E ela: Nada. 

A medicação não tinha dado nenhuma reação - que são muitas. Então foi feito mais duas pulsoterapias e depois de alguns dias com o diagnostico - Lupús Sistêmico, kikuchi- fujimoto e Nefrite grau 4 -, ela teve alta. Não tem nenhuma sequela exceto, que faz tratamento renal porque o Lupús passou a morar nos rins e mais algumas pulsoterapias. Apesar de tudo que ela e nós enfrentamos naqueles meses, hoje ela está bem. Que o meu Deus seja glorificado.
Se não fosse Ele (e todos os profissionais que cuidaram dela no hospital), tenho certeza que eu teria perdido minha filhinha.

Andressa e a equipe médica após alta - Hospital Universitário Gaffrée Guinle, Rj.
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Essa é uma história verídica contada por um leitor ao Reticências por e-mail. Foi editada por mim para facilitar a leitura. Se você gostou do texto e tem ou conhece alguma história emocionante e/ou de superação para contar, me envie. Será um prazer para mim e os leitores do Blog vê-la por aqui. Além de alguma maneira, poder ajudar outras pessoas.
Envie para: katti_martins@hotmail.com

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